
E bailam os meus cabelos ao sabor do vento, a minha musica embala-me os sentidos e deixa-me numa viagem aliciante entre o prazer natural de caminhar o areal debaixo da camada de estrelas que o céu exibe. Descalço as minhas sandálias, mergulho os meus dedos na areia húmida, perplexa examino ao fundo do percurso que iniciei, que um vulto poisava junto ao candeeiro com luz fosca. A silhueta, exibia-se esguia, o seu braço posto como se estive de vigia. Estaria ali a vigiar-me de longe, vendo-me percorrer vezes sem conta o mesmo destino? Seria somente a minha imaginação a vaguear? Estou sozinha prostrada diante do mar, envolta de nada e ali, repousava um corpo inerte, inflexível... uma sombra sobre o chão de pedra de envolvia aquele areal. Como poderia encontrar-me junto a alguém que não conheço mas que, consigo identificar na perfeição todos os seus traços sem sequer me aproximar.
Se avanço tu recuas, se me mexo corro o risco de te ver desaparecer, estrada fora... pelo negro breu que esta escuridão assombra o plano quase perfeito onde te encontras. Desisti arriscar, devagar fui-me aproximando, tu recuaste à mesma passada «Não tenhas medo», «Medo? Não é medo. É desejo, e o desejo é tanto que ao aproximar-te receio magoar-te».
À distância o diálogo manteve-se noite a dentro, o sol rompia no horizonte, quando do silêncio emergia o ruído dos carros que passavam ao largo de nós, na marginal paralela ao mar. «Porque não partes?» perguntei-lhe eu, receosa de o ter incomodado. «Não parto, porque a razão que me impede jaz à minha frente, bela e perfeita como o raiar do sol, o canto dos mais belos pássaros e tão inata como a própria natureza do mar, ondulantes os teus cabelos envolvem-me na madrugada em que num sobressalto acordo sozinho na minha cama, olho perplexo para a tua ausência e pergunto-me porque aqui não estás. Não sabes o quão difícil se torna, olhar pela janela, debruçar-me sobre o parapeito e ver-te do outro lado a examinares complexa o fumo que inalas, que expeles quando travas o doce odor que emana o teu cigarro. quão perfeita és, na tua condição e mesmo assim... não te posso ter. É triste encontrar-me neste complexo de édipo, de não saber quem sou, olhar-me ao espelho e ver-me incompleta metade, reflexo dividido e desfragmentado, perdido no século entre amor e certa perdição...» e ele continuou proferindo o seu discurso poético, quase mágico... persigo-o com vontade de o beijar, mantenho-me perto, consegui invadir-lhe o seu misero espaço entre os quilómetros de areal, ele petrificado descalço no areal, nem se apercebeu que a distância diminuíra. ...«na minha mente te moldo à forma do meu corpo por entre suspiros e emoções, descrevo-te promenorizadamente o que é amar-te a ti, da forma mais incomensuravel e impossível de descrever, desenho-te no papel numa aproximação distante da realidade, transbordo tua beleza e delicadeza nas folhas pautadas em que te escrevo por palavras longe da tua majestade. Elevo-te ao patamar mais próximo do azul celeste pendente sobre nós...» e as palavras dele prenderam-me ao chão, perto dele. As suas palavras eram musica no meu coração, em tom quente como o abraço esperado quando sozinha atravessei o halo do tempo, e ele continuava o seu discurso, usando palavras cuidadas e essas palavras eram não só minhas, mas como palavras sobre mim. «... e o destino revelou-se malvado ao separar-me de ti, nos teus olhos castanhos prendo toda a minha atenção, nesse teu odor que me embebede os sentidos, fico cego de tanta beleza irradiares nessa tua pele pérola, onde te envolves como roseira em espinhos, princesa refugiada na torre mais alta do castelo fortificado, onde te guardas intacta e insegura na tua própria segurança, anseio ser teu príncipe e raptar-te desse teu vale profundo em que te escondes. Deixa-me trepar esse muro e salvar-te, do monstro infernal que criaste. E da beira do abismo eu te espreito, de mão pronta a segurar-te sem medo...» e o sol deslocava-se ao longo da costa, até que começava a mergulhar mar a dentro levando consigo todo o esplendor revelado ao longo do dia, e trazendo consigo um melancólico arroxear pendente nas poucas nuvens existentes. O dia tornou-se rapidamente noite, fizeste-te caír estendido no areal, discursando como havias feito o dia todo, e eu ali parada sobre o teu corpo pendente na areia a escutar-te atentamente, ouvir-te e não só ouvir-te como ver-te com o coração embebido em tanto amor, que nutria por ti antes do outro dia terminar. «... meu amor, como peno não poder embalar-te nos braços, com toda a dedicação que mereces, beijar-te os lábios não só de forma carnal, tocar-te a alma como quem te toca a mão, poder estender-te no meu colo intensificando o meu olhar no teu, repousando a minha mão junto a tua, cambaleada junto ao teu peito que rejeita qualquer dor. meu amor, meu amor, quanto amor por ti tenho e quanto amor não te posso dar, por acção deste maldito destino que para ti me impede de avançar, de te mostrar que não estás só, que comigo poderás contar, nas horas mais sólidas em que a monotonia te invade, ou então quando a nostálgia do teu passado de assombra a mente, para te poder ver chorar e chorar contigo o que de mal te foi acontecer, poder desenhar em ti o sorriso perfeito pelo qual me apaixonei, quando por mim passaste alegremente neste mesmo local, cantando junto ao mar teus feitos que mais tarde te irás lembrar - o seu olhar, momentaneamente cai sobre o farol - e poder levar-te ali, poder passar a noite contigo num sonho incorrigivel de prazer, poder fazer-te Deusa na terra, seres meu centro de percepção. Corrijo-me, pois foco de toda a minha atenção já és. A lua identifica-se perfeitamente contigo, é una em fases, tal e qual como tu, mas não tão bela, não tão grande, não tão mágica e imprivisivel como tu. Minha musa inspiradora, minha fonte interminável de segurança, deixa-me tocar-te fundo como nunca antes ninguém te tocou. Passeias-me exaustivamente no meu pensamento, e isso, não me incomoda, ilumina-me o rosto, faz brilhar o meu olhar. Como, gosto te de ver saltitar nas pedras do jardim, como gosto de te ver caminhar no areal, como gosto de te ver dobrar as dobras das calças e mergulhares os teus pés, as tuas mãos no salgado mar... como gosto que sejas somente assim, tal e qual como és. E hoje, ontem, quase amanhã é, foi e será o dia em que o amor ganhar definição, pois...» pousou finalmente o seu olhar no meu, a sua mão na minha e seu braço na minha cintura e terminou a sua fala. «... no teu ser encontrei a minha morada. Amo-te.»
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