
Ó como te vi, pairando no ar como se não houvesse gravidade. Os meus olhos desviaram a sua órbita rotineira e detalharam ao pormenor quem tu eras.
Passaste e sorriste. Sorriste, como jamais havias sorrido para alguém. Deambulaste sem sentido, e de forma discreta tornaste a olhar-me. "Senhora/menina" perguntavas-te a ti mesmo, em tom coloquial e meio esquizofrénico. Preenchi-te de dúvidas, declarei-me com o meu olhar. Tropeçaste e coraste.
Despiste o casaco, uma manga após outra. Ajeitaste as calças e o cinto. Levantei-me e divaguei um pouco. Seguiste-me. Olhei-te, provocando-te (como nunca antes havias sido provocado) de modo a que me seguisses. Pisquei-te o olho, tornaste a tropeçar.
Num ápice surpreendente, virei-me para ti e caminhei na tua direcção, ajeitas-te a gola da camisola, um suor frio atravessou-te a pele como um choque eléctrico. Pousei-te a mão no peito e perguntei-te clara e objectivamente porque me seguias, e desajeitadamente tornaste o teu discurso redundante e nada dizias. Voltei a perguntar-te, desta vez, mais calma, mas na mesma determinante a querer saber a resposta entalada no teu peito.
Descalcei suavemente os meus saltos, com uma mão segura no seu ombro, fingi o desequilíbrio para que nos seus braços ele me amparasse. Quando se apercebeu do esquema, corou uma mais vez.
ainda não obtive a minha resposta, determinada perguntei-lhe se ele se importava se eu lhe roubasse algo.
Perplexo e pestanejante, perguntou-me no seu tom masculino ingénuo: "roubar?"
Sim!
Não lhe permiti qualquer contra-argumento. Foquei os seus lábios, beijei-o como nunca antes mais, alguém o havia beijado. Depois da acção ele olhou-me nos olhos com as suas mãos nas minhas "porfavor, diz-me que não o acabaste de fazer". Fiz.
Atónito de êxtase, tomou-me nos seus braços e levou-me para longe dali. Nem queria acreditar.
(...)
-Desculpa, tens lume?
-"Sim, tenho... toma."
-Obrigado!
-"Olha, desculpa..."
-Sim?
-"Eu já te conheço... uma vez, num sonho."
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